A
inteligência do carpinteiro de Nazaré tão impressionante que ele discursava
sobre temas que só seriam abordados pela ciência 19 séculos depois, com o
surgimento da psiquiatria e da psicologia. Cristo se adiantou no tempo e
discorreu sobre a mais insidiosa das doenças psíquicas, a ansiedade (Mateus
6:25-34). A ansiedade estanca o prazer de viver, fomenta a irritabilidade,
estimula a angústia e gera um universo de doenças
psicossomáticas.
A medicina,
como ciência milenar, sempre olhou para a psiquiatria e para a psicologia de
cima, com certa desconfiança, pois as considerava ciências novas, imaturas.
Muitos estudantes de medicina, não davam grande importância às aulas de
psiquiatria e psicologia. Queriam estudar os órgãos do corpo humano e suas
doenças, mas desprezavam o funcionamento da mente. Todavia, nas últimas décadas,
a medicina tem abandonado sua postura orgulhosa e procurado estudar e tratar o
ser humano integral – organismo e psique (alma) –, pois vem percebendo que
muitas doenças cardiovasculares, pulmonares, gastrintestinais, etc. têm como
causa transtornos psíquicos, entre os quais se destaca a
ansiedade.
Jesus
discorreu sobre uma doença que somente agora tem ocupado os capítulos principais
da medicina. Provavelmente, no terceiro milênio, um excelente médico será antes
de tudo um profissional com bons conhecimentos de psiquiatria, psicologia e
cultura geral. Será um profissional menos ávido pedir exames laboratoriais e
prescrever medicamentos e mais interessado em dialogar com seus pacientes,
alguém com habilidade para penetrar no mundo deles, detectar seus níveis de
ansiedade e ajudá-los a superar as dores existências. Será um profissional que
terá uma linha de pensamento semelhante àquela apregoada há tantos séculos por
Cristo. Ele era o mestre do diálogo.
esse mestre
compreendia a mente humana e as dificuldades da existência com uma lucidez
refinada. Preocupava-se com a qualidade de vida dos seus íntimos. Discursava
eloquentemente: “Não andeis ansiosos pela vossa vida.” Isso não significa que
devessem abolir completamente qualquer reação de ansiedade, mas que não vivessem
ansiosos. Em seus discursos, Cristo já se referia à ansiedade natural, normal,
presente em cada ser humano, que se manifesta espontaneamente quando estamos
preocupados, quando planejamos, quando expressamos um desejo, quando passamos
por alguma doença ou contrariedade. Todavia, segundo ele, essa ansiedade
eventual, normal, pode se tornar doentia, um “andar” ansioso.
Não me
deterei em detalhes sobre o pensamento de Cristo acerca da ansiedade. Quero
apenas comentar que ele afirmava que as preocupações exageradas com a
sobrevivência, os pensamentos antecipatórios, o enfrentamento de problemas
virtuais, a desvalorização do ser em relação ao ter, etc. cultivam a ansiedade
doentia. O mestre da escola da existência era um grande sábio. As causas que ele
apontou não mudaram no mundo moderno; pelo contrário, elas se
intensificaram.
Quanto mais
conquistamos bens materiais, mais queremos acumulá-los. parece não haver limites
para a nossa insegurança e insatisfação. Valorizamos mais o “ter” do que o
“ser”, ou seja, possuir bens mais do que ser tranquilo, alegre, coerente. Essa
inversão de valores gera a ansiedade e seus frutos: insegurança, medo,
apreensão, irritabilidade, insatisfação, angústia (tensão emocional associada a
um aperto no tórax). A insegurança é uma das principais manifestações da
ansiedade. Fazemos seguros de vida, da casa, do carro, mas, ainda assim, não
resolvemos nossa insegurança.
Cristo tinha
razão: há uma ansiedade inerente ao ser humano, ligada à construção de
pensamentos, influenciada pela carga genética, por fatores psíquicos e sociais.
Só não tem ansiedade quem está morto. Somos a espécie que possui o maior de
todos os espetáculos, o da construção de pensamentos. No entanto, muitas vezes
usamos o pensamento contra nós mesmos, para gerar uma vida ansiosa. Os problemas
ainda não ocorreram, mas já estamos angustiados por eles. O capítulo 6 de Mateus
diz: “Não andeis ansiosos pelo dia de amanhã... Basta a cada dia o seu próprio
mal.” Cristo queria vacinar seus discípulos contra o estresse produzido por
pensamentos antecipatórios. Não abolia as metas, as prioridades, o planejamento
do trabalho, pois ele mesmo tinha metas e prioridades bem estabelecidas, mas
queria que os discípulos não gravitassem em torno de problemas
imaginários.
Muitos de nós
vivemos o paradoxo da liberdade utópica. Por fora, somos livres porque vivemos
em sociedade democráticas, mas por dentro somos prisioneiros, escravos das ideia
dramáticas e de conteúdo negativo que antecipam o futuro. Há diversas pessoas
que gozam de boa saúde, mas vivem miseravelmente pensando em câncer, infarto,
acidentes, perdas.
O ensinamento
de Cristo relativo à ansiedade era sofisticado, pois, para praticá-lo, seria
necessário conhecer uma complexa arte intelectual que todo ser humano tem
dificuldade de aprender: a arte de gerenciar os pensamentos.
Governamos o
mundo exterior, mas temos enorme dificuldade em gerenciar nosso mundo interior,
o dos pensamentos e das emoções. Somos subjugados por necessidades que nunca
foram prioritárias, pelas paranoias do mundo moderno: o consumismo, a estética,
a segurança. Assim, a vida humana, que deveria ser um espetáculo de prazer,
torna-se um espetáculo de terror, de medo, de ansiedade. Nunca tivemos tantos
sintomas psicossomáticos: cefaleias, dores musculares, fadiga excessiva, sono
perturbado, transtornos alimentares como a bulimia e a anorexia nervosa, etc.
uma parte significativa dos adolescentes americanos tem problemas de obesidade,
e a ansiedade é uma das principais causas deste transtorno.
Para
compreendermos a importância do gerenciamento dos pensamentos e as dificuldades
de executá-lo, precisamos responder pelo menos a duas grandes perguntas sobre o
funcionamento da mente. Qual é a maior fonte de entretenimento humano? Pensar é
uma atividade inevitável ou é um trabalho intelectual voluntário que depende
apenas da determinação consciente do próprio homem?
A maior fonte
de entretenimento humano não é a TV, o esporte, a literatura, a sexualidade, o
trabalho. A resposta está dentro de cada um de nós. É o mundo das ideias, dos
pensamentos, que o ser humano constrói clandestinamente em sua própria mente, é
que gera os sonhos, os planos, as aspirações.
Quem consegue
interromper a construção de pensamentos? É impossível. A própria tentativa de
interrupção já é um pensamento. Pensamos durante os sonhos, quando estamos
trabalhando, andando, dirigindo.
As ideias
representam um conjunto organizado de cadeias de pensamentos. O fluxo das ideias
que transitam a cada momento no palco de nossas Inteligências não pode ser
contido. Todos somos viajantes no mundo das ideias: viajamos para o passado,
reconstruindo experiências já vividas para o futuro, imaginando situações ainda
inexistentes; viajamos também para os problemas existenciais.
Os juízes
viajam nos seus pensamentos enquanto julgam os réus. Os psicoterapeutas viajam
enquanto atendem seus pacientes. Os cientistas viajam enquanto pesquisam. as
crianças viajam nas suas fantasias. Os adultos, nas suas preocupações. Os
idosos, nas suas recordações.
Uns constroem
projetos e outros, castelos inatingíveis. uns viajam menos em seus pensamentos,
outros viajam muito, concentrando-se pouco em suas tarefas. essas pessoas pensam
que têm déficit de memória, mas, na verdade, possuem apenas déficit de
concentração por causa da hiperprodução de pensamentos.
Pensar não é
uma opção voluntária do ser humano; é o seu destino inevitável. Não podemos
interromper a produção de pensamentos; só podemos gerenciá-la. É impossível
interromper o fluxo de pensamentos, pois além do eu (vontade consciente) existem
outros três fenômenos (o da auto checagem da memória, a âncora da memória e o
complexo auto fluxo)* que fazem espontaneamente uma leitura da memória e
produzem inúmeros pensamentos diários que são importantes tanto para a formação
da personalidade como para gerar uma grande fonte de entretenimento, podendo se
tornar também a maior fonte onde ansiedade humana.
Cristo tanto
prevenia a ansiedade como discursava sobre o prazer de viver. Dizia: “Olhai os
lírios dos campos” (Mateus 6:28). Queria que as pessoas fossem alegres,
inteligentes, mas simples. porém, assim como seus discípulos, nós não sabemos
contemplar os lírios dos campos, ou seja, não sabemos extrair o prazer dos
pequenos momentos da vida. A ansiedade estanca esse prazer. Apesar de o mestre
da escola da vida discursar sobre a ansiedade e suas causas, sua proposta em
relação ao sentido da vida e ao prazer de viver era tão surpreendente que, como
analisaremos no próximo capítulo, chocam a psiquiatria, a psicologia e as
neurociências.
Ao longo de
quase duas décadas pesquisando o funcionamento da mente humana, compreendi que
não há ser humano que não tenha problemas no gerenciamento dos seus pensamentos
e emoções, principalmente diante dos focos de tensão. O maior desafio da
educação não é conduzir as pessoas a executarem tarefas e dominarem o mundo que
as cerca, mas conduzi-las a liderar seus próprios pensamentos, seu mundo
intelectual.
É possível
ter status e sucesso social e ser uma pessoa insegura diante das contrariedades,
incapaz de gerenciar as situações estressantes. É possível ter sucesso
econômico, mas ser um “rico-pobre”, sem o prazer de viver, de contemplar os
pequenos detalhes da vida. é possível viajar pelo mundo e conhecer vários
continentes, mas não caminhar nas trajetórias do seu próprio ser e conhecer a si
mesmo. É possível ser um grande executivo e controlar uma multinacional, mas não
ter domínio sobre os p´próprios pensamentos e reações emocionais, ser um
espectador passivo diante das mazelas psíquicas.
Cristo não
frequentou escola, não estudou as letras, mas foi o Mestre dos Mestres na escola
da vida. era tão sofisticado em sua inteligência que praticava a psiquiatria e a
psicologia preventiva quando estas nem ensaiavam existir.
(Fonte: Análise da Inteligência de Cristo –
Augusto Cury).
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